quarta-feira, 30 de abril de 2025

morada

lembrar não é voltar.
lembrar é construir.

tijolo,
argamassa,
respiração.
tudo junto.

escrevo como quem finca
firme o corpo no próprio chão.

o texto é casa:
alguns cômodos rangem,
outros ainda nem têm porta.
há paredes que escondem,
e outras que escancaram.
observo.

memória não é santidade.
é obra em andamento.

rememoro
e restauro:
faço arqueologia dos afetos,
retiro a poeira dos restos,
com um pincel fino,
com fôlego.

o trauma, madeira bruta.
a palavra, meu pulso vivo.
o corpo, meu perfume.

escrevo assim:
com martelo,
com silêncio,

com suor,
com poeira nos olhos.

um tijolo.
de cada vez.
uma palavra.
de cada vez.

respiro o ar
e minha morada
tem cheiro de mim.

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